Sunday, February 25, 2007

Não te amei
Amei uma imagem
Refletida num espelho
Era eu mesma
Mas te devo
O olhar iluminado
O sorriso largo
A beleza dos apaixonados
O desejo
Fantasia por ti despertada?
Não importa
Mesmo assim penso que te devo
Amei
a sensação de amar
- Passageira -
Mas sobretudo
aquela imagem minha,
refletida no espelho...

Cecília Quadros

Friday, February 16, 2007

O Poema

Um poema como um gole dágua bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como pequenina moeda de prata perdida para sempre
na floresta noturna.
Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa
condição de poema.
Triste.
Solitário.
Único.
Ferido de mortal beleza.

Mario Quintana

Monday, February 12, 2007

Paisagem pela câmera captada




Céu, primeiro te descrevo:
vários tons de azul brilhando entre nuvens.
Logo abaixo o mar.
Não mais o azul estático:
mais escuro, profundo, em movimento.
E a onda avançando: branca, brava,
desafiando o menino moreno, calção vermelho,
que a mede, encara, se prepara:
ou dá um impulso, com ela salta,
arrisca um “caldo”e se rala na areia,
ou a “fura”: braços estendidos, mãos unidas,
como um nadador experiente,
homem do mar, valente...
Espuma e areia no raso, quase completam o quadro.
Um pouco mais abaixo, uma faixa de praia
de um bege molhado, é quase nada
neste espetáculo de céu, nuvens,
menino e água, num final de tarde...

Para Felipe

9-2-07

Thursday, February 08, 2007

Deixemos...

Deixemos que o tempo voe
que a lágrima escorra
o corpo se encolha
que as pedras rolem
as cores desbotem
que o céu se tinja de rosa
as rosas murchem
que o passar do tempo nos assuste
e os sonhos jamais se realizem;
que se abandonem os planos
se deixe para lá desenganos
que os fortes vençam
ou a vida o destino, Deus
ou seja lá o que encontremos pela frente.

Deixemos que tudo
ou nada aconteça
que meu amor feneça
você me esqueça
que o céu se turve
ou o brilho do sol nos ofusque
nos faça perder o rumo
neste estranho mundo de luz, sombra,
ódio, amor e amargura...

Cecília Quadros

VII (Da morte, Odes Mínimas)

Perderás de mim
Todas as horas

Porque só me tomarás
A uma determinada hora

E talvez venhas
Num instante de vazio
E insipidez.
Imagina-te o que perderás
Eu que vivi no vermelho
Porque poeta, e caminhei
A chama dos caminhos

Atravessei o sol
Toquei o muro de dentro
Dos amigos

A boca nos sentimentos

E fui tomada, ferida
de malassombros, de gozo

Morte, imagina-te


Hilda Hilst

Wednesday, February 07, 2007

De tudo quanto amamos

De tudo quanto amamos o que resta,
O riso desbotado dos retratos,
A talagarça dos momentos gratos
Ou a tristeza desse fim de festa?

Ficou por certo a ruga em nossa testa
Inventariando feitos e relatos,
E vozes e perfis somando fatos,
E a desfocada imagem da seresta.

E tudo o fogo afaga em canto findo,
Este porque de coisas devolutas,
E o tempo nômade que foi partindo.

Ficou de quanto amamos nos escolhos
A restinga das horas dissolutas,
E o mar aprisionado em nossos olhos!

Paulo Bomfim

Voltei

Deixei minha camisola sob o travesseiro,
o livro de versos na mesma prateleira,
e é como se nunca tivesse partido.
Não quebrei todos os laços,
preservei o meu espaço,
só não estou mais dividida.

Quero diante do espelho,
me ver inteiramente nua,
esquadrinhando meu rosto,
analisando meu corpo,
atrás das marcas da vida,
e daquela paixão ... finita,
que foi céu, inferno, estorvo.

Despida a veste bonita,
tal qual vestido de noiva,
fica a mulher, mãe, esposa,
e a poesia, sem asas, sem vôos.

Cecília Quadros

Friday, February 02, 2007

Ainda és
Ainda estás
Subjugas minha vontade
Revolves meu coração
Reviras a minha vida
Assim da noite pro dia
Basta que um sonho impossível
Indesejável, intrometido

Te traga – impositivo -
me deixando outra vez vencida
inquieta, amargurada,
Presa da antiga emoção

Sim, és
Dono, senhor
De espaço tão almejado
Que, ai de mim, não domino
Pois não o alcança a razão

Sim...
Ainda vives colado
Em meu incoerente,
Desgraçado coração...

Cecília

Thursday, February 01, 2007

Tenho gana de vida
Se adoeço, me trato
Se caio, me levanto rápido
Se a tristeza me prende, escapo
Não me importam as muletas,
desde que suportem meu peso
pois liberam minha alma,
deixando-a inteira,
livre para a felicidade.
Venço desânimo, distância,
tudo , em nome da afinidade...
Vivo o dia de hoje
não por desapego ao passado,
desencanto ou desesperança.
Só não quero desperdício,
jogar fora um momento
sequer da minha vida.
E assim vou levando,
mais do que sendo levada:
vivendo meu tempo, meu momento,
minha hora...que de resto,
queira ou não queira,
um dia vou ter que ir embora.
Passo eu, passa a vida,
e tudo o que se foi,
não será senão história...

Cecília

IX

Um galopar de sombras e novelos
deixam fugir a luz e seus delírios.
Há um garimpar de estrelas nos cabelos
Da treva que se deita sobre os lírios...
No peito esses dormidos corações
Inda batem de amor, e o sangue corre
Por veias que alimentam solidões
E artérias naufragando em céu que morre.
Galopam sensações que só pervagam
Em bairros de saudade e finitudes,
As doidas sonatinas hoje vagam
Nos portos onde aportam os alaúdes.
Um vira-mundo vira o sol e a lua:
Que desejo de paz na noite nua!

Paulo Bomfim

Coração Inquieto

O peso deste amor me esmaga.
Às vezes, alma penada,
quero vagar por outros mundos,
outros mares, outros amores;
habitar outros ninhos, viver outras vidas,
não necessariamente mais felizes.
Coração inquieto, coração de poeta.

Cecília Quadros